Realidade? Imagine

Por que nos apegamos tanto ao imaginário?

Fiz essa pergunta a mim mesma após começar a assistir um anime chamado “Chuunibyou Demo Koi Ga Shitai”. Nele uma garotinha que tem síndrome de 8º série (chuunibyou), ou seja, acredita que seu mundo imaginário é real, conhece e se torna amiga de um menino que já sofreu dessa síndrome e odeia qualquer lembrança que isso lhe traga. A história se desenrola, e em quase todo episódio ele tenta fazê-la acreditar que nada do que imagina ser verdade realmente é verdade, até que em um deles ela finalmente aceita isso. É aí que seu mundo desmorona.

Isso me fez pensar em todas as vezes nas quais eu e alguns amigos, brincamos de ser personagens de livros ou filmes de que gostamos. No quanto uma realidade falsa pode ser reconfortante ou talvez apenas mais divertida e animadora de se viver.  No mundo “real”, nos dizem pra sermos fortes, então qual o problema em se imaginar como o herói de uma série? Em achar que consegue lutar contra qualquer um e fazer coisas extraordinárias? As pessoas buscam nesses personagens um exemplo, e ele as faz continuar acreditando que, mesmo que tudo pareça uma merda, elas devem continuar tentando.

No último episódio do anime, o menino percebe que estava errado, e que o mundo imaginário de sua amiga era na verdade, a realidade dela. E tudo que ela fingia ser, era o que ela era. Ele vê que todos nós criamos um mundo só nosso, e é esse mundo que nos faz ser como somos. Todos sofremos de chuunibyou, e sempre sofreremos. O imaginário é real.

Sonho eterno

Deitada no colchão ela chorou. Não tinha nada pelo que chorar, e ainda assim chorou. Abraçou o travesseiro, molhado de suas lágrimas salgadas, e não o largou. Tinha sido seu amigo sempre, o único que nunca a tinha abandonado. Pessoas julgavam-na estranha demais para ser confiável, mas ela não entendia o porquê. Estava sempre sorrindo, ajudava os outros, se dava bem com todo mundo, coisas que poucos conseguiam fazer. Ainda assim, não tinha um amigo sequer com quem pudesse falar sobre tudo, e o mais próximo disso ela afastara, por medo de decepcioná-lo. Sim, ela sabia que não fazia sentido, mas fez mesmo assim.

Suas tardes eram desperdiçadas com coisas inúteis, mas ninguém percebia. Só ela. Continuava a fazê-las pois diziam que era necessário. Tinha dúvidas. Esperava avidamente o momento quando deixaria esse lugar, voltaria para casa. Não conseguia falar isso para ninguém, sabia que a achariam maluca, diriam que não havia “casa” para voltar, que aquele era o lugar dela. Mas ela tinha certeza que tudo era idiotice. Todas as regras de comportamento, de beleza, de tudo, eram apenas um sonho ruim. E como em todo sonho, brincar com isso começava a ficar chato, e você deseja acordar. Desejava acordar, fazia muito tempo, mas por mais que tentasse, não conseguia. O travesseiro era seu amigo, seu protetor e seu inimigo. Despejava suas lágrimas sobre ele como uma forma de redenção. Nunca mais acordaria. Estava presa nesse sonho eterno.

Mas vamos falar de amor…

Desculpe-me ter que dizer isso, mas, meninas, seu príncipe encantado não virá. Nunca.  Se você ainda acredita que sim, pare de ler ou aceite de uma vez que o mundo não é um livro da Stephenie Meyer e que você é uma solteirona velha que sabe menos sobre amor do que uma menina de 14 anos.

As pessoas tem o costume de ver beleza e fofura em todos os filmes, livros, séries que assistem. Isso chegou ao ponto de comprarem “50 tons de cinza”, um livro que é puramente sexo, sem nenhum romance, nem mesmo uma história sólida e consistente, e dizer que achou o livro bonitinho. Elas postam fotos no Instagram (nova modinha da galera “pop”) junto ao livro como se estivessem segurando Shakespeare! Me irrita profundamente até um Kama Sutra disfarçado ser tido como um livro romântico.

O problema é que essa geração foi criada sobre fábulas de cavaleiros encantados, montados em cavalos magníficos, que vão salvar princesas de sua prisão horrível. E essas crianças que foram alimentadas com contos de fadas, tentam passar isso para a vida real, transformando suas vidas em uma espera incansável só para que seus príncipes venham salvá-las. Transformando qualquer um em bruxas malignas ou dragões terríveis, e qualquer romance em seu “felizes para sempre”.

A indústria cinematográfica, que quer lucrar, passa a produzir filmes com esse estilo. Como resultado, temos uma enxurrada de filmes pseudo-românticos com a mesma estrutura. As comédias românticas são um exemplo clássico disso, onde você pode distinguir os personagens básicos de contos de fadas, como vilão, mocinho e mocinha, de preferência apaixonados, e também ver o mesmo roteiro básico na maioria dos filmes. Tem gente que até confunde um e outro, de tão parecidos que são! Aí, essa geração que consumiu contos de fadas na infância e comédias românticas um pouco mais tarde, deixa-se levar e procura essas mesmas coisas no mundo real.

Só que a partir daí, ela deixa de ver tudo que prova que não existe “felizes para sempre”, como divórcios e brigas, e fica extremamente depressiva com o fim de um relacionamento. Se entope de remédios e outras drogas porque não consegue mais esperar por alguém que nem sabe quem é ou se realmente virá. As histórias nunca contam se príncipes deixaram as princesas apodrecerem no castelo, e isso é meio perturbante. Procurar e ver amor perfeito em toda parte é um escapismo para fugir desse medo, mas também uma fuga da realidade.

E é por isso, em parte, que vemos pessoas se iludindo cada vez mais falando de amor com as outras, não importando se existem coisas mais importantes no que pensar. Em todo lugar podemos ver pessoas desesperadas por encontrar esse sentimento, essa pessoa inexistente, e, para afastar o medo de não ser real, torna a realidade imaginária. O amor virou moda, e quem não segue a moda, é excluído do grupinho.

Tic Toc

E ela estava lá. Sozinha. Naquela praça mal iluminada. O relógio da igreja no fim da rua batia. E ela escutava. Sem carros. Sem pessoas. Sem vento. Só o relógio da igreja. O chafariz havia parado. Nada se movia.  Mas o relógio da igreja ainda estava lá. E ela tremia. Com frio. Talvez medo. Nada que admitisse.

Olhava para os lados. Não. Ainda não. Esperou. Sombras a envolviam. O relógio da igreja batia. E então ela chorou. Dizia que não chorava. Mas chorou. Muito. E então parou. Rápido como começou. Enxugou os olhos. Pegou o casaco. Vestiu. Andou até o fim da rua. E desapareceu. Ninguém viu. Só as sombras. E o relógio da igreja ainda batia.

Só mais um minutinho…

Semana passada, tive que ir ao banco. Sim, aquele terrível lugar onde você pega uma senha, e espera. E espera. E espera. Aí quando você é o próximo, entra um velhinho na sua frente e fica por mais um tempão. Então chega a sua vez, você faz o que tinha que fazer em 2 minutos, e pega outra senha porque não pode fazer tal serviço ali. Isso se a máquina de senhas não estiver quebrada, pois se sim, significa mais espera, mais fila, mais raiva.

Estava esperando, como sempre, e me veio à cabeça o porquê de bancos nos incomodarem tanto com sua lerdeza: somos acostumados a usar aparelhos rápidos, a andar em carros rápidos, a fazer tudo com a maior rapidez possível. A cada dia inventam máquinas que procuram otimizar o tempo de trabalho, como computadores mais rápidos, internet mais rápida, e acaba por ser normal não ter que esperar.

Isso é uma das consequências naturais do capitalismo, que quer sempre mais em menos tempo, para aumentar os lucros. “Tempo é dinheiro”, costumamos dizer. Corremos para sobrar um tempo para nós, e muitas vezes odiamos esse tempo porque temos que esperar. Ou seja, nossa pressa pra acabar logo algo, faz com que as coisas as quais queríamos e duram mais de 5 minutos, fiquem chatas e enfadonhas. Perdemos a alegria de um momento assim como perdemos tempo. Acho que talvez, devêssemos parar e aproveitar um pouco, sem relógios. Sem tic-tacs na cabeça.