Pare, olhe, escute

Estava andando, há alguns dias atrás, pensando em coisas muito importantes, como no meu almoço ou o que faria quando chegasse em casa, com muita pressa, pra variar, quando precisei passar por uma linha de trem. Como sempre acontece quando você quer muito chegar a algum lugar logo, uma coisa vai fazer atrasar, no meu caso, era um trem vindo.

Olhei para o relógio, tentei estimar quanto tempo perderia ali olhando o tamanho do trem, já impaciente. No meio desse tédio, olhei a placa que dizia “Pare, olhe, escute”. Já tinha passado milhares de vezes por aquele lugar, mas nunca realmente tinha prestado atenção naquela placa.

Então vi como estava: impaciente, com uma mochila jogada nas costas e vários livros na mão, entediada por ficar 30 segundos no mesmo lugar, ignorando tudo ao meu redor. Resolvi seguir a placa. “Pare, olhe, escute”

Parei minha correria, meu desespero com o tempo (e com a falta dele). Parei meus pensamentos importantíssimos, que não poderiam esperar, e de me preocupar com a tonelada de coisas que tinha dentro da minha mochila e nas minhas mãos. Olhei para o trem, suas cores se misturando e deixando tudo tão vermelho, marrom, laranja, com as pessoas e o asfalto ao lado dando contraste. O céu acima, com formas malucas e desengonçadas, me fazendo sorrir. Escutei os sons daquele momento, altos, bagunçados, complexos, mas tão naturais. Os passos vindo e indo, palavras de todas as formas e cores, carros, vento, chão, luz. Fiz tudo ao mesmo tempo. Era tudo uma imensa roda colorida e cheia de sons, perfeita para quem parasse e a quisesse ver.

O trem passou, pessoas atravessaram, e eu continuei ali.

Folhas em branco

Olhou para o papel em branco. Nada. Rabiscou algumas palavras, mas elas não diziam o que queria. Na verdade, ela mesma não sabia o que queria escrever. Sentia um desejo profundo de colocar algo na folha, algo importante, que a fizesse sentir como se tivesse cumprido uma missão. Mas nada vinha.

Levantou-se, tomou um copo d’água. Olhava-o buscando ver as letras que tanto queria encontrar. Só viu ondas, sem mar, ou vida, ou amores. Uma brisa fria soprou da janela. Fechou-a. Voltou à cadeira, desta vez pegou o computador, talvez ali conseguisse ter alguma inspiração.

A tela a encarava, quase tanto quanto ela encarava a tela. Uma observava a outra, mastigando seus pedaços, engolindo cada um deles, sem fazer nenhum movimento. O teto talvez fosse mais interessante, e passou a observá-lo. Não era. O tédio continuava prendendo qualquer sinal de vida.

Dormiu, acordou, dormiu de novo. “Não posso escrever, sou inútil”, pensou. “Preciso de vida, não de teatro”. Então caminhou. Sem parar, procurando encontrar o que nunca teve ou viu. Apenas papel, caneta, e um destino incerto.