A menina que sorriu

Ela andava sozinha, quase marchando. Tinha raiva, e a sensação de que a injustiça não tinha sido só com ela percorria-a friamente. Preocupava-se mais porque havia sido com ela, mas é isso que as pessoas fazem, só se importam com algo quando acontece com elas mesmas.
De qualquer modo, ainda tinha todas as palavras que gostaria de ter dito na hora, e não disse. Talvez por medo (apelidado de cautela por muitos), mas principalmente porque sabia que nada adiantaria. Esstava acabado.
Apesar da raiva que sentia, andava sorrindo. Tentava manter o calor que sentia no rosto, apenas na mente.Andar calmamente, face serena. Há algum tempo, uma cidade havia proibido a raiva ou qualquer outro sentimento denominado “ruim”. Ficou conhecida como a mais conhecida feliz do estado. O governador gostou da lei, e o estado, por sua vez, seguiu o modelo da cidade, e proibiu-os também. O presidente ficou sabendo, e ordenou o país inteiro ser feliz, com pena de exílio para quem não fosse. Outros países souberam, e também adotaram a lei. Logo, não havia nenhum lugar habitável onde as pessoas não tivessem que ser felizes. E a pena de exílio tornou-se de morte.
E então, todos viveram felizes. Havia um sorriso em cada lugar; ruas, hospitais, aeroportos, velórios, nas brigas de casais. As pessoas não podiam aguentar esse falso sorriso para sempre, podiam? Sim, poucas delas ficaram infelizes com a lei, e por causa dela, não podiam mostrar isso. Todas mortas.
Assim estava a menina; viva, mas morta. Do que adiantava estar viva? Mas se fosse para morrer, faria as pessoas tirarem seus malditos sorrisos do rosto.
Um mês depois, aproveitou que teria uma festa para comemorar os 10 anos da lei na praça, colocou sua máscara com um sorriso por cima de seu próprio sorriso. Era a primeira vez que estava realmente feliz em todos esses anos. Chegou na praça, e esperou os moradores chegarem lá. Subiu no palco montado no centro, disse boa noite, sorriu, e explodiu tudo.

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